domingo, 31 de agosto de 2008

VOLTOU A GUERRA-FRIA?

Enquanto os EUA, a NATO e a UE vão aumentando o tom das críticas e das exigências à Rússia[1], a propósito da sua presença militar na Geórgia, mantém-se a polémica a propósito da anunciada intenção russa de reconhecer o desejo de independência da Ossétia do Sul e da Abkházia enquanto cresce o que já vais sendo classificado como um novo clima de guerra-fria.

A juntar a esta polémica, e um pouco contra a corrente informativa dominante, a agência noticiosa AFP informou hoje que «Observadores da Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE)[2] acusaram a Geórgia de ter tido um papel importante no agravamento da crise no Cáucaso…» reportando-se ao teor da edição de amanhã da revista alemã Der Spiegel, que cita «…"relatórios" enviados "de maneira informal" ao governo alemão».

É certo que se a decisão russa de apoiar as intenções independentistas de ossetas e abkhazes merece crítica e reprovação (idênticas às utilizadas contra os EUA e os países europeus que reconheceram a declaração unilateral de independência do Kosovo), não é menos verdade que esta só terá acontecido devido ao precedente que foi o Kosovo.

Porque julgo que acabará por imperar nesta polémica a velha figura da “realpolitik”, a separação daquelas duas províncias da Geórgia transformar-se-á num facto consumado e depois restará esperar pela próxima crise que envolva uma qualquer outra região com aspirações independentistas e suficiente interesse estratégico para uma das grandes potências a apoiar. É que em ambos os casos são evidentes os interesses de americanos e russos.

Com a fragilização da Geórgia a Rússia consegue não só demonstrar alguma da sua força, deixa um importante aviso aos seus vizinhos mais entusiasmados com o “eldorado” americano e recoloca-se no tabuleiro do xadrez energético mundial numa posição um pouco mais reforçada.

Já no caso do Kosovo, o interesse americano pelo território pode ir além do simples quebrar da muralha pós-soviética, pois segundo reportou há meses o jornal suíço TRIBUNE DE GENÈVE, num artigo de Andrés Allemand, aquele território estará a converter-se numa gigantesca plataforma rotativa para o crime organizado internacional[3], representando a heroína que por ele é canalizado cerca de 80% do volume consumido na Europa a qual lhe chegará do maior produtor mundial – o Afeganistão – que por acaso também é um território sob ocupação militar norte americana.

Com este tipo de coincidências alguém poderá esperar um futuro tranquilo para regiões como o Cáucaso e os Balcãs?
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[1] Veja-se a propósito esta notícia da BBC NEWS, que refere a hipótese da UE decidir pela aplicação de sanções à Rússia.
[2] A Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) é uma organização de países ocidentais orientada para a promoção da democracia e do liberalismo económico na Europa; teve origem na CSCE (Conferência sobre a Segurança e a Cooperação na Europa), realizada em Helsínquia em 197e é actualmente constituída por 56 países membros, todos da Europa (incluindo a Federação Russa e todos os países da UE), da Ásia Central e da América do Norte (Canadá e Estados Unidos).
[3] Segundo o autor as actividades ilícitas abrangem o tráfico de droga, de mulheres e de órgãos humanos e envolvem as maiores figuras do governo kosovar, como seja o caso primeiro-ministro Hashim Thaçi.

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