domingo, 19 de julho de 2009

ASSIM VAI A AMÉRICA…

Que os sinais de recuperação económica tardam em aparecer parece-me bem evidente, mesmo quando alguns meios de comunicação não perdem a oportunidade de fazer manchete com uma ou outra notícia mais optimista e sensacionalista1.

Exemplo do clima depressivo que se vive um pouco por todo o lado pode bem ser
esta notícia do THE NEW YORK TIMES que relata a situação “sui generis” de uma localidade norte-americana que pondera implementar uma política de concentração dos seus habitantes por forma a reduzir os custos fixos e a “devolver” à natureza as áreas assim desocupadas.

Este fenómeno de redução dos espaços populacionais representa uma solução naturalmente ditada pela redução de uma população forçada a abandonar as casas judicialmente executadas para pagamento das suas dívidas e pelo crescimento do desemprego.

Uma noção da verdadeira dimensão social deste fenómeno, cujo número oficial (dados do BUREAU OF LABOR STATISTICS referentes a Junho de 2009 e que podem ser confirmados aqui) é de 14,7 milhões de desempregados, representando 9,5% da população activa, mas que observada de forma mais desagregada revela enormes disparidades em função da idade (os jovens apresentam uma taxa de 24%) e da origem étnica...

facto que será ainda mais grave quando se constata que o SHADOW GOVERNMENT STATISTICS2 estima que a taxa de desemprego pode já ter ultrapassado os 20%.

Para melhor entender a dura realidade das populações recorde-se que o fenómeno do actual desemprego na economia americana resulta de factores (o desemprego originado no processo de deslocalização das unidades produtivas para o sudoeste asiático, iniciado na década de 1990, e agora agravado pela retracção comercial originada na crise financeira) que se têm vindo a prolongar no tempo.

Mas a situação anteriormente descrita, que conhece na localidade de Flint (vizinha de Detroit e grandemente afectada pela profunda crise que atravessa o sector da construção automóvel norte-americana) o seu principal expoente, afecta muitas outras localidade e existem até estados federias que vivem verdadeiras situações de falência financeira.

Exemplo disso mesmo é a situação do estado da Califórnia, o principal contribuinte para o produto nacional norte-americano, que no final do mês de Junho suspendeu todos os pagamentos a fornecedores, substituindo-os por notas de dívida. Com uma dívida estimada em mais 26 mil milhões de dólares, o estado governado pelo “Exterminador” Arnold Schwarzenegger é um dos 48 estados federados que no conjunto apresentam uma dívida superior a 160 mil milhões de dólares e que se debatem com a obrigatoriedade legal de não apresentarem orçamentos deficitários. Confrontados com a retracção nas economias e com a correspondente redução nas receitas fiscais, os governos estaduais e locais limitam-se a repercutir a quebra de receitas em despesas como a educação e o apoio social, agravando ainda mais os já debilitados orçamentos das famílias mais carenciadas e ampliando o efeito sobre a redução do consumo.

As conhecidas divergência políticas entre Democratas (favoráveis a um aumento da carga fiscal) e Republicanos (ferozes oponentes a semelhante medida) tem conduzido a situações de impasse que além de agravarem as dificuldades das equipas de gestão local estão a conduzir o governabilidade dos estados federados a verdadeiros becos sem saída.

O desespero de algumas equipas estaduais é tal que além da referida ideia de concentrar as populações como forma de controlo e redução dos gastos com o fornecimento de serviços como o saneamento, a iluminação pública e a segurança, já há quem defenda a liberalização do comércio das chamadas drogas leves como via para o aumento das receitas fiscais3, opção que não deixa de ser interessante de analisar quando os seus promotores são os mesmos dogmáticos que, em nome de uma pseudo defesa da saúde pública, aplicaram limitações ao consumo de tabaco.

Enquanto os estados federais lutam pela sua própria sobrevivência económica, os banqueiros de Wall Street têm vindo a publicar os restados do último trimestre e, espanto, alguns já voltaram aos volumosos lucros de antes do início da crise; segundo o THE NEW YORK TIMES4, o JP MORGAN CHASE e o GOLDMAN SACHS não só estão a conseguir vencer a crise como de novo a obter grandes lucros, mas isso será o mote para o próximo “post”...
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1 Exemplo, entre outros, pode bem ser a notícia do ECONÓMICO que assegura que fruto das suas mais recentes previsões «Roubini leva Wall Street à quarta sessão de ganhos».
2 John Williams é um economista de Oakland que há cerca de cinco anos gere a página Shadow Government Statistics na Net, na qual apresenta índices e estimativas estatísticas alternativas às disponibilizadas pelos organismos oficiais por entender que os dados oficiais têm vindo a ser manipulados de forma a apresentarem resultados mais favoráveis.
3 Exemplo disto mesmo é esta notícia do jornal francês LE FIGARO: «Les États américains face à la crise budgétaire».
4 Ver a notícia publicada há dois dias: «Two Giants Emerge From Wall Street Ruins».

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