segunda-feira, 29 de novembro de 2010

NOVOS SINAIS (TRISTES) DOS TEMPOS


Renovando a sua tradição de consultas populares, a Suíça voltou este fim-de-semana às urnas.
Facto habitual para os cidadãos daquela federação mas um pouco estranho para o resto do Mundo, a quem custa a entender este mecanismo de constante consulta popular, os cidadãos helvéticos foram chamados a pronunciar-se sobre duas questões: uma proposta consagrando a expulsão de estrangeiros condenados por crimes e outra sobre o lançamento de um imposto sobre os rendimentos mais elevados.
Espantosamente, ou não, a segunda, consagrando um princípio aparentemente mais equitativo e de maior justiça social, foi rejeitada, enquanto a primeira, geradora de maiores desigualdades e quiçá atentatória do princípio de igualdade dos cidadãos perante a justiça, foi aprovada.
Mesmo numa época onde o desnorte parece ser a norma e depois de há cerca dum ano terem aprovado uma outra proposta visando a proibição de edificação de minaretes[1], no que pode ser entendido como uma discriminação religiosa, eis que os suíços voltam a repetir nas urnas a imagem duma sociedade cada vez menos solidária e a raiar a xenofobia, num país onde quase ¼ da população é estrangeira.

[1] Sobre a questão ver o «post» «SINAIS (TRISTES) DOS TEMPOS»

sábado, 27 de novembro de 2010

PARA LÁ DA GREVE


Mais do que avaliar a dimensão e os efeitos da Greve Geral que teve lugar no passado dia 24 importa pensar para lá dela.

A Greve fez-se, o país parou, em boa medida, e agora... que lições tirar disso?

Que é indispensável reabrir o diálogo entre Governo e Sindicatos, como pretende esta notícia do DN, ou afinal a greve não terá tido grande significado como pretende estoutra do JORNAL DE NOTÍCIAS?

Independentemente do ponto de vista sobre a dimensão, a importância da greve em Portugal foi reconhecida na imprensa europeia (de que é exemplo esta notícia do LE MONDE) facto que aumenta a responsabilidade das direcções indicais num correcto aprofundamento do movimento de oposição às políticas preconizadas pelo Governo a pretexto do combate ao défice público, as quais seguem de perto as que têm sido concertadas em Bruxelas que afirmando querer evitar o efeito de contágio entre as economias comunitárias, propõe tratar isoladamente cada uma delas em vez de alterar radicalmente o modelo orçamental da comunidade (criando um único orçamento comunitário) e o modelo de financiamento (com o BCE a financiar directamente aquele orçamento em vez de financiar os bancos que em seguida financiarão cada um dos estados-membros com os inevitáveis ganhos resultantes entre a taxa cobrada pelo BCE e as taxas exigidas a cada um dos estados), opção que se tem revelando um completo fracasso.


Mesmo considerando as especificidades do caso português, que já antes do eclodir da crise apresentava evidentes sinais de debilidades estruturais, situação que em nada será contrariada com medidas como o aumento de impostos directos sobre o trabalho ou de impostos indirectos (IVA), e a existência de uma evidente estratégia de desacreditação do euro (em benefício do dólar e da libra), nada impede que as populações se oponham de forma consciente àquela que tem sido a estratégia privilegiada pelos poderes estabelecidos, a saber: a defesa dos interesses das grandes empresas em prejuízo da vasta maioria da população dos estados que têm vindo, um após outro, a constituir o alvo preferencial do “interesse” dos “mercados”.

Esta estratégia tem sido particularmente clara no caso da Alemanha, cujo governo nunca revelou a menor preocupação pela situação global da EU e para o qual a questão central tem sido a defesa dos interesses (leia-se dos investimentos) dos bancos alemães em cada uma das economias “atacadas” e o seu próprio interesse no crescimento das exportações impulsionadas por um euro menos forte; este raciocínio não é exclusivo dos alemães, antes extensível a outros estados-membros que ostensivamente têm sobreposto os seus interesses nacionais aos interesses do conjunto da UE, como é o caso dos ingleses (cujos bancos se encontram grandemente expostos à divida irlandesa) que se apressaram a integrar agora o grupo de apoio à Irlanda quando, a pretexto de não integrarem a Zona Euro, se recusaram a fazer o mesmo em benefício da Grécia.

Para se ter uma ideia mais clara deste fenómeno, veja-se a imagem seguinte


que sintetiza a exposição dos países europeus periféricos (Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha e Itália) entre si e dos três grandes (Alemanha, França e Reino Unido).

As fragilidades e as contradições que alemães, franceses e ingleses não param de revelar – e que segundo alguns comentadores estarão também a alimentar o movimento especulativo – podem (e devem) ser igualmente exploradas por quem queira liderar a luta por outras políticas de combate à crise, para cujo sucesso muito dependerão factores como a capacidade de fundamentação clara das alternativas, nomeadamente a já referida necessidade de um orçamento comum, a da colocação do crédito ao serviço dos povos e não do sector financeiro, e a capacidade de mobilização das vontades.

É que a atestar por esta notícia do DN que assegura que os «Portugueses trabalham mais horas pelo mesmo dinheiro», não deverão faltar boas vontades que, se para já têm contribuído para aumentar a produtividade nacional, algo que alguma imprensa e alguns comentadores insistem em negar, e os lucros das empresas, poderão no futuro levar avante uma verdadeira e eficaz política de combate à crise baseada não nas necessidades de quem tudo pode mas nos anseios de quem algo deseja.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

A CRISE DAS DÍVIDAS SOBERANAS

Ocupados (e preocupados...) com os problemas internos e com a aproximação da Greve Geral convocada (facto histórico) pelas duas centrais sindicais, intoxicados com a realização local duma Cimeira da NATO, poderemos ser tentados a quase esquecer a origem principal dos nossos maiores problemas.

Para isso também contribui (e muito...) a poderosa máquina da desinformação que não deixa escapar qualquer oportunidade para agitar os “terrores” das dívidas públicas, das falências, da produtividade, enquanto os políticos se entretêm em elaborados simulacros de grandes medidas e grandes planos para resolver a crise.



Preocupados em colmatar os “buracos”, em defender o sistema financeiro, em agradar aos “mercados” e em não melindrar os “poderosos”, os políticos ignoram (ou, o que é ainda mais grave, desconhecem completamente) a principal origem da crise – o modelo distorcido de distribuição da riqueza – e recusam-se a ver a evidência da falência dum modelo de desenvolvimento baseado nas exportações (como se num universo finito todos pudessem vender sem ninguém comprar) e da acumulação de poderes no sector financeiro.

Enquanto isto a crise (aquela que dizem estar em vias de resolução mas que não pára de crescer), expressa na persistente anemia das economias ocidentais e no crescimento das taxas de desemprego, continua a alastrar e a estender os seus efeitos a camadas cada vez maiores das populações. Depois de termos assistido em 2007 ao rebentamento da bolha do imobiliário (o célebre “subprime”), da sua óbvia extensão ao sector financeiro (aquele que a alimentou, dela lucrou e que graças à pronta intervenção dos governos poucos efeitos negativos sentiu) que desde 2008 se debate entre as crescentes necessidades de liquidez, a insaciável ânsia especulativa e um quase completo desconhecimento dos riscos que alegremente assume porque, confortável dos apoios públicos, não ignora que estes serão “nacionalizados” logo que necessário, estamos agora a iniciar a travessia de mais uma fase na completa desagregação do modelo económico.

Criada a ilusão de que o Mundo não sobreviverá ao colapso do sector financeiro global (quase como nos anos 50 do século passado se criou o “terror nuclear”) deu-se o passo final no aprofundamento duma crise da qual apenas poderemos emergir mais fortes se conseguirmos corrigir os erros que a originaram. Como em tantas outras crises (económica se não só) o resultado desta poderá ser devastador se em vez de agirmos sobre as suas reais origens persistirmos no erro de confundir a árvore com a floresta.

Eu sei que o truísmo pode não ser claro, mas parece-me a melhor forma de sintetizar o momento que vivemos. Quando os governos europeus, confortados pelo regresso ao crescimento dos seus PIB’s, se deixaram arrastar para a ideia de que a crise estaria resolvida e que era chegado o momento de concentrar as atenções nos desequilíbrios orçamentais que esta provocara em detrimento da acção preventiva contra o que a originou, reentregaram de bandeja a iniciativa do “jogo” a um sector financeiro sediado em Wall Street e na City londrina, que mal refeito do susto mas consciente da fragilidade das suas moedas preferidas, o dólar e a libra, não hesitaram em transformar a fraqueza em força e para evitar o soçobrar das suas divisas lançaram um processo especulativo contra a mais fraca das suas rivais. Com um yen ainda não refeito da crise japonesa do início do século, um rublo isolado, uma rupia e um real sem significativa expressão comercial e um yuan fortalecido pelo crescimento económico chinês e protegido por Pequim, foi fácil identificar o melhor rival, o euro, que constituindo uma real ameaça apresentava ainda a vantagem de uma dupla fragilidade: um peso crescente na cena internacional sem o corresponde peso político.

Assim, o euro e a UE, com a manifesta incapacidade dos seus estados-membros se unirem no essencial, deram início ao que poderá ser apenas o princípio duma avalanche de estados a entrarem em processos de insolvência. Fragilizados pelas divisões intra-comunitárias, confrontados com a oposição popular, os estados da Zona Euro arriscam caminhar um após outro para um colapso financeiro que apenas poderá ser evitável com uma actuação concertada no sentido de retirar ao sector financeiro o poder discricionário de criação de moeda que detém.

Por muito que os sectores mais conservadores (ou neoliberais) rejeitem a ideia, o facto é que a origem da crise sistémica que atravessamos reside fundamentalmente na total subordinação do interesse geral aos interesses dum único sector de actividade, que no presente “obrigam” os estados a financiar os défices parcialmente originados pela opção de saneamento dos bancos em situação de falência a taxas muito superiores à que os próprios bancos intervencionados se financiam junto dos Bancos Centrais (no caso português aqueles diferenciais representam 6 vezes a taxa de refinanciamento do BCE ou 24 vezes a taxa de refinanciamento do FED[1]), pelo que o primeiro passo para a redução daqueles défices deveria passar por proporcionar igualdade nas condições de acesso ao crédito e assim reduzindo a influência de bancos e especuladores na definição das políticas económicas e sociais.


[1] Recorde-se que a taxa a que os bancos comerciais, os mesmos que os estados salvaram da falência em 2008, se financiam junto do BCE é de 1%, enquanto a praticada pelo FED é de 0,25%.

sábado, 20 de novembro de 2010

GREVE GERAL

Desde que no final do mês de Setembro foram anunciadas as novas medidas de austeridade a incluir no Orçamento Geral do Estado para 2011, dentre as mais destacadas das quais se conta o corte de 5% na massa salarial da Função Pública e o aumento do IVA de 21% para 23%, apresentadas como indispensáveis para reduzir a despesa pública e o défice público, que ficou clara a real intenção do governo: contribuir para o aumento dos lucros das empresas.



Apreciado numa perspectiva puramente macroeconómica, o OGE, além dos seguros efeitos recessivos na economia nacional – importa não esquecer que a uma redução do poder de compra das famílias (seja por via do agravamento da carga fiscal directa ou indirecta, seja pela redução dos salários) se fará rapidamente sentir numa economia que há muito apresenta evidentes sinais de fragilidade – não corresponde às intenções de equilíbrio orçamental anunciadas, pois as medidas propostas nunca poderão apresentar os resultados que os seus defensores lhes atribuem porque assentam em pressupostos manifestamente errados.

Primeiro, porque no caso em que a redução dos salários inclui o Sector Empresarial do Estado, os 5% de redução não podem nunca ser apresentados como redução da despesa pública pois aqueles salários não representam um encargo directo do OGE. Assim, os 150 milhões de euros de poupança anunciados pelo ministro das Finanças serão contabilizados nas contas daquelas empresas e não nas do OGE, traduzindo-se em acréscimo dos lucros (ou redução dos prejuízos), mas nunca em redução da despesa pública.

Segundo, porque uma redução dos salários acarretará uma redução da receita cobrada em IRS (qualquer coisa como 30 milhões de euros, caso se considere uma taxa média de incidência do IRS de 20% sobre os anunciados 150 milhões de euros) e o consequente agravamento do défice.

Apreciado numa perspectiva social, dificilmente alguém poderá concordar com um OGE que, não respondendo à necessidade de equilíbrio orçamental, agrava ainda mais a já desajustada política de redistribuição de rendimentos. A redução das contrapartidas sociais num período em que se atravessa uma das maiores crises de emprego, em que as perspectivas de futuro para os desempregados seniores (maiores de 45 anos) e para os jovens (na procura do primeiro emprego ou na mera reentrada no mercado de trabalho) são as piores das últimas décadas, para não falar na redução no abono de família (medida que além socialmente injusta em nada favorece a natalidade) e na acentuação da tendência histórica para o aumento da carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho dependente.

E aqui retornamos à famigerada decisão de redução dos salários na Função Pública e nas Empresas do Sector Empresarial do Estado entre as quais se contam empresas que actuam em mercados concorrenciais e normalmente geradoras de lucros.

Quantos daqueles trabalhadores, cansados de ano após ano ouvirem administradores e directores louvarem a elevada qualidade do quadro de pessoal e a extrema importância do mesmo para a imagem e os resultados das empresas, continuam a defrontar-se com as mais variadas ineficiências de equipamentos e instalações e a serem regularmente submergidos na voragem dos objectivos e dos resultados, se confrontam agora com a absurda decisão de virem a servir de exemplo para que se estenda ao conjunto dos trabalhadores do Sector Privado a há muito apregoada e peregrina ideia que da redução dos salários resultará a melhoria da produtividade nacional.
Assim, e porque a atestar por exemplos anteriores, a anunciada e muito defendida participação maciça dos trabalhadores na Greve Nacional marcada para o dia 24 de Novembro deverá conhecer o resultado habitualmente associado a este tipo de manifestações, ou seja: a perca de um dia de remuneração para os grevistas e a redução das despesas para os accionistas das empresas; enquanto as direcções sindicais parecem falhas de ideias concretas para o aprofundamento da luta, atrevo-me a deixar duas humildes propostas.

Que o previsível insucesso prático da Greve Geral seja respondido com o lançamento de formas de luta mais criativas e, quiçá, bem mais eficazes, como seja o caso de uma Greve de Zelo. Conhecidas que são as anacrónicas regras de funcionamento fácil será transformar uma forma de luta pacífica, como esta, na mais devastadora das confusões.

Caso a primeira seja entendida como “sabotagem económica” pelos dirigentes sindicais (ou, mais prosaicamente, apresentada como impraticável pelas inevitáveis dificuldades na adesão) restará ainda o recurso àquela que poderá ser a mais terrível das armas: o ridículo.

Neste caso a proposta é de que, de moto próprio, os milhares de trabalhadores das empresas do Sector Empresarial do Estado assumam de forma plena, clara e sem subterfúgios o seu reconquistado estatuto de Funcionários Públicos e, em conformidade, passem a adoptar os comportamentos adequados, nomeadamente através do zeloso cumprimento de horários, a simplificação no trajar (a crise a isso mesmo obriga) da utilização das instalações das empresas para a realização das indispensáveis refeições, previamente trazidas de casa, e doutras formas de protesto que seguramente a fértil imaginação nacional não deixará de originar.

Esta opção, mesmo como recurso último e em resultado de uma qualquer imobilidade sindical, poderá ser a mais eficaz. 

Basta querermos!

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

E SE...


E se era de esperar que o tema deste “post” gravitasse à volta do título do ECONÓMICO «Irlanda admite recorrer ao fundo europeu de resgate» ou até de outras questões importantes – a manutenção de um comando NATO em Oeiras ou a concertação da estratégia para O Afeganistão –, que não deixarão de constar na agenda e nas conversas do corredor  na Cimeira da NATO que terá lugar este fim-de-semana em Lisboa.

E se nem movido pela avalanche de notícias, reportagens e comentários sobre as avassaladoras medidas de segurança que irão transformar a capital do país num território cercado (tão cercado que, no auge das mais severas medidas económicas para combater a crise e aumentar a produtividade nacional, o governo de José Sócrates decretou uma tolerância de ponto para o dia do início das operações de segurança), o tema fosse o irracional dessas medidas de que os governantes mundiais cada vez mais se rodeiam (e há quem continue a assegurar que o medo dá asas...)


E se, pelo contrário, ao deparar-me com a notícia do «Embaraço no Governo com demissão do chefe dos espiões», não resistisse a deixar aqui um outro olhar sobre uma questão que a avaliar pelo corpo da notícia do PUBLICO parece ter resultado dos cortes orçamentais impostos pelas medidas de austeridade; é que sem entrar em qualquer tentativa de avaliação e justificação dos gastos com os serviços de informação, não posso deixar de sublinhar o que pode representar o espanto por uma atitude pouco comum; e se o director do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED) decidiu demitir-se simplesmente por protesto contra o que entende serem medidas contrárias ao seu projecto de trabalho?

E se, como este, outros directores e administradores de serviços e empresas públicas batessem com a porta perante a irracionalidade das medidas de austeridade?

E se eu parasse de sonhar que este país é dirigido por HOMENS...

terça-feira, 16 de novembro de 2010

e-IDEIAS

Enquanto a opinião pública nacional continua a ser diariamente bombardeada com notícias sobre a subida dos juros das dívidas soberanas denominadas em euros, com a mais recente polémica da política nacional (a emergência de uma coligação governamental), com o debate na especialidade do OE 2011, ou até com os preparativos para a Cimeira da NATO que decorrerá no próximo fim-de-semana em Lisboa, pequenas notícias tendem a passar quase despercebidas.
Dentre estas, e numa altura em que tanto de fala da necessidade de redução da despesa pública, gostava de destacar uma que referindo a possibilidade do Estado poupar um mínimo de 80 milhões de euros se optar pelo uso de “software” livre, constitui um excelente exemplo do muito que podia se alcançado caso fossem utilizadas verdadeiras políticas de gestão cuidadosa dos dinheiros públicos.

Os cálculos, apresentados pela ESOP (Associação de Empresas de Software Open Source Portuguesas) baseiam-se nos gastos em “software” informático, que em 2009 ascenderam a 160 milhões de euros, e à estimativa realizada por aquela associação de que o “software” produzido pelos seus associados poderia substituir entre 50% a 70% daqueles gastos.
Conhecida a realidade noutros países europeus, nomeadamente o facto das administrações públicas de países como a Espanha, a Noruega, a Holanda e a França serem já grandes utilizadoras daquele tipo de “software” e quando os “especialistas” partidários custam a encontrar formas de reduzir a despesa é especialmente importante a divulgação deste tipo de contributos.
É certo que a Microsoft e outras empresas do género, que apostaram em cimentar o enriquecimento dos seus accionistas na total dependência dos utilizadores informáticos, não gostarão deste género de iniciativas, mas como estes contribuem muito pouco para as receitas públicas nacionais...

sábado, 13 de novembro de 2010

DE SEUL NADA DE NOVO


O pretenso Governo Económico Mundial, que por reunir as 19 maiores economias e a UE é vulgarmente conhecido pela sigla G20, teve esta semana em Seul mais uma das suas reuniões, que terminou como as anteriores com uma pomposa declaração final de significado quase nulo.
As sempre anunciadas intenções piedosas, com o crescimento mundial à cabeça, voltaram a ser preocupação secundária num cenário mundial cada vez menos optimista, onde mesmo quanto ao anunciado tema principal - a questão das valorizações (ou desvalorizações) cambiais - a cimeira dos mais ricos voltou a demonstrar a sua verdadeira utilidade quando terminou sem a apresentação de qualquer solução para o diferendo que ameaça incendiar os tempos mais próximos – o diferendo entre o dólar e o yuan.


Num cenário macroeconómico de estagnação (há mesmo quem se lhe refira em termos de recessão) americanos e chineses confrontam-se pela liderança  económica, numa fase em que as vantagens de potência hegemónica dos americanos se revelam cada vez mais insustentáveis e em que o peso da estrutura industrial chinesa cresce dia a dia. Reflexo disso mesmo foi a recente deslocação do presidente chinês, Hu Jintao, à Europa que Obama procurou contrabalançar com uma viagem relâmpago à Índia e à Indonésia, imediatamente antes da Cimeira de Seoul.

Numa tentativa de debelar o comportamento anémico da economia doméstica, o FED (e a administração Obama) lançou um novo programa de estímulo económico (o “quantitave easing”) que mais não é que nova injecção de dinheiro no circuito económico na esperança que o aumento de liquidez reanime uma economia há muito debilitada pelas políticas de deslocalização industrial, as mesmas que originaram os “milagres económicos asiáticos”. Com as deslocalizações a originarem crescentes comerciais excedentes no sudoeste asiático, especialmente na China, e com esta economia a beneficiar de condições muito especiais, não espanta que nas vésperas da Cimeira de Seul parecesse que a maioria estaria de acordo numa política que contrariasse a crescente influência chinesa. Porém a realidade acabou por ser bem diversa e no rescaldo da reunião resultou... que tudo deverá continuar como está.

Os chineses, face ao desentendimento entre os possíveis opositores e a debilidade da posição de uns EUA muito dependentes da China para financiarem a sua dívida pública, continuarão a beneficiar da vantagem que representa o facto dos seus maiores bancos serem públicos (podendo assim o governo de Pequim criar moeda conforme as suas necessidades), enquanto mantém uma política de desvalorização da moeda nacional como via de incentivo às exportações; os EUA, que bem gostariam de desvalorizar o dólar para melhorar as exportações e reduzir a dívida pública, vêem-se obrigados a proferir grandes discursos de apoio às políticas liberais e quiçá a aplicar alguma contenção à sua política doméstica de “quantitative easing”, na expectativa de não afugentarem as fontes de financiamento de que dependem quase totalmente.

A Europa, num cenário de convulsão como o descrito, poderia aproveitar este desentendimento acordado para fazer valer o seu peso, mas os desacordos internos, a fragilidade das economias dos seus estados periféricos (Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha e Itália) e a debilidade dos seus líderes (nacionais e comunitários) inibe-a de qualquer veleidade, pelo que restam a Rússia, Brasil e Índia como únicos possíveis contrapoderes, países cujas economias têm revelado bons desempenhos mas que, dependentes do sistema financeiro internacional poucas esperanças poderão alimentar.

Significativo disso mesmo é o teor das conclusões da cimeira que não deixaram de incluir beatíficas normas de controlo bancário, apresentadas como destinadas a assegurar uma maior resistência daquelas instituições às tempestades que se prenunciam, pois a perspectiva de aumento do risco das dívidas soberanas, começando pelas denominadas em euros, não deverá tardar a estender-se à libra e ao dólar, facto que ocorrerá tanto mais rapidamente quanto os poderes políticos se revelam incapazes (ou incompetentes) para tomar as decisões que se impõem na defesa dos interesses dos seus próprios povos.

Prova disso mesmo é a declaração subscrita pelos membros europeus do G20 a propósito da situação irlandesa, que mais não faz que ecoar a ideia de que a intervenção do Fundo Europeu de Estabilização Financeira estará para muito breve, facto que poderá significar uma rápida extensão à situação portuguesa.
Estes factos e a reconhecida incapacidade das propostas orçamentais apresentadas pelo governo de José Sócrates – que além da duvidosa aplicação prática serão seguramente negativas para o crescimento económico – mais não fazem que adensar as perspectivas adversas há muito anunciadas, pelo que outras intervenções se deverão seguir à grega e o fundo que a UE criou apressadamente não dispõe senão de 750 mil milhões de euros. A somar a esta limitação importa ainda lembrar as posições que ultimamente alemães e franceses têm assumido quanto ao auxílio aos estados-membros, pelo que o cenário de instabilidade em torno do Euro estará para durar.

Mesmo sem querer ser pessimista, os sinais de agudização da fase de insolvência dos Estados, tal como o prenunciou o “think tank” europeu LEAP, são claros tal como a tibieza e/ou a incompetência dos líderes europeus que permitiu que esta se iniciasse pelo euro.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

NEGOCIAÇÃO BULLDOZER


Depois de ter sido um facto estranho, como um apelo do Papa pela Paz no Médio-Oriente e a pronta e veemente reacção israelita, a trazer para as notícias uma ronda negocial entre judeus e palestinianos que se sabia desde o início com reduzidas probabilidades de sucesso, eis que volta agora outro facto acessório, a notícia de que «Israel anuncia 1300 novas casas em Jerusalém Oriental», a reavivar o interesse no processo de paz


O recurso à política do “bulldozer” não é exclusivo do governo israelita e parece estar a fazer escola (à semelhança da política de edificação de muros de segurança), pois já esta semana o DN dava conta de um «Acampamento desmantelado pela via da força», para referir a acção em que governo marroquino procedeu à destruição de um acampamento sarauí às portas de El Aiún, a capital do território (Saara Ocidental) que ocupa desde a retirada espanhola em 1975, enquanto sobre o mesmo assunto o PUBLICO referia «Cinco marroquinos mortos no assalto ao campo de protesto sarauí».
Mas o que me leva a retomar aqui o tema do conflito israelo-palestiniano e da disputa em torno da Saara Ocidental nem sequer é para repetir o que noutras ocasiões escrevi ou para criticar o cinismo das reacções judaicas, mas tão somente para chamar a atenção para a forma perfeitamente tendenciosa como a imprensa ocidental continua a tratar estas questões; seja na forma como refere a acção militar contra civis, seja quando deu muito mais destaque à reacção de Tel Aviv que ao teor do apelo papal (diga-se perfeitamente inócuo), ou agora quando pretende fazer passar a ideia de que a política de expansão israelita é natural esquecendo as normas de direito e as resoluções internacionais que impedem a ocupação permanente de territórios militarmente ocupados.
Mesmo admitindo alguma remota possibilidade de entendimento quanto a questões de soberania, como a palestiniana e a sarauí, basta constatar a sobranceria com que os governos israelita e marroquino actuam – no caso de Benjamim Netanyahu e do seu aliado ultra conservador Avigdor Lieberman não renovando a moratória sobre a construção de novas residências judaicas nos territórios ocupados e no caso da monarquia marroquina ao usar um aparato militar com meios terrestres e aéreos para desmantelar um acampamento civil, – para sabermos que iniciativas, como as promovidas pela administração Obama ou pela ONU, terão um desfecho idêntico às anteriores.
Não será de espantar que governos como o judaico e o marroquino actuem à margem das normas internacionais no que definem como sendo os seus interesses, mas o caso é particularmente grave quando ocorrem factos como o anúncio de novas construções judaicas ou acções de força precisamente quando decorrem negociações enquanto a imprensa ocidental continua sem revelar um mínimo de equidade na abordagem de questões delicadas, como a palestiniana e a sarauí.
Já não espero sequer uma referência aos que defendem solução diversa da preconizada por Washington – a famigerada solução dois povos-dois estados – que Tel Aviv finge querer (ora com maior, ora com menor convicção) e à qual a cada vez mais desacreditada OLP se agarra como uma bóia salvação, pois talvez alguns dos seus dirigentes sintam bem a fragilidade da solução a que os estão a forçar, mas apenas um mínimo de informação que reflicta o que acontece dos dois lados do conflito.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

O GUIA DE CÉSAR DAS NEVES PARA A CRISE


Com a argúcia e sentido de oportunidade que há muito lhe conhecemos, eis que a crónica semanal de César das Neves[1] nos proporciona hoje um excelente guia para enfrentarmos a crise (aquela que ele mesmo diz ser agora um dado oficial); em quatro simples lições somos informados da melhor forma de enfrentarmos uma situação perfeitamente normal, pois como o próprio diz «[a]s crises são normais, frequentes, e não são o fim do mundo. Já tivemos muitas, várias muito piores que esta, e teremos bastante mais no futuro».
Depois de o ler não pude deixar de pensar que afinal a solução é muito mais simples que parece, pois bastará aplicar a velha máxima católica apostólica romana que assegura aos mansos o reino dos céus; senão vejamos, o que o reputado economistas preconiza é tão simplesmente que nos deixemos de queixas, fantasias e acusações, trabalhemos mais e ainda mais e... a riqueza fluirá (para as contas bancárias dos poderosos)!
O que o autor não explica (nem sequer por breves instantes lhe terá ocorrido ) é como espera que uma multidão de trabalhadores despojados de tudo (até da sua dignidade) aceite pacificamente continuara trabalhar (os que ainda têm trabalho) como se nada tivesse ocorrido, como se o reino dos céus existisse e estivesse já ali ao virar da esquina.
Não constituindo novidade a confirmação que nas concepções ideológicas de César das Neves não há lugar para as pessoas, apenas para a quantidade estritamente necessária de assalariados indispensáveis para asegurar a multiplicação do investimento, já a forma quase despudorada como, em plena crise, incita os leitores à submissão e à aceitação da inevitabilidade da próxima, raia, no mínimo, o abjecto, apreciação que se manterá mesmo que se pretenda infileirar o comentário no mesmo grupo de notícias, como esta do PUBLICO, que a pouco mais de duas semanas da Greve Geral já começaram a preparar o terreno para a desmobilização dos cidadãos ou para a desvalorização da sua mobilização.


[1] Intitulada «GUIA PARA A CRISE», pode ser lida na íntegra aqui.