sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

PRENDA…

Contra toda a lógica e o mais elementar calculismo político em que sempre baseou a sua actuação, «Cavaco Silva não enviou diploma para fiscalização preventiva do OE 2014».

Nem as dúvidas (muitas e fundadas até pelos antecedentes) levantadas pela oposição, nem a unanimidade no último veredicto pronunciado pelos juízes do Tribunal Constitucional (TC), fizeram vacilar o homem que há muitos anos se apresenta ao País como aquele que nunca tem dúvidas e raramente se engana mas que depois de ter desprestigiado como nenhum antecessor o cargo que ocupa – ao prescindir do respectivo vencimento em benefício da mais choruda pensão que aufere – e de agora ter visto unanimemente confirmada uma sua raríssima dúvida (que por acaso, mero acaso, afectaria a tal choruda pensão) corre o sério risco de maximizar a sua irrelevância política, transformando-se cada vez mais num mero aposentado em Belém.


A repetição da estratégia usada com o OE de 2013 – promulgação seguida de pedido de fiscalização sucessiva ao TC dalgumas normas, com possível anúncio na protocolar mensagem presidencial de Ano Novo – será, talvez, a melhor prenda natalícia que Belém tem para oferecer a Passos Coelho, ainda que esta represente a pior prenda para o País e a última opção a que deveria recorrer depois de constatados os efeitos ocorridos este ano e porque o risco de rejeição constitui mais um factor de instabilidade (quando todo o discurso do Governo e do Presidente assenta em ladainhas à estabilidade) além de se poder traduzir em novo vexame para o primeiro.

O argumento, repetidamente invocado, dos medonhos prejuízos resultantes do atraso da entrada em vigor de novo orçamento é apenas mais uma mentira e outra manipulação de idêntico jaez aos dos anunciados 120 mil novos empregos de Passos que afinal são apenas 22 mil, pois qualquer atraso na aprovação ou promulgação dum novo orçamento é automaticamente colmatado com a continuidade do documento em vigor mediante a aplicação do regime de duodécimos, opção politicamente menos ruinosa que a de arriscar a promulgação dum orçamento que, há semelhança dos dois anteriores, corre o sério risco de vir a ser declarado inconstitucional.

A dúvida que ficará para deslindar no final de longos quatro meses (é esse o prazo de tempo que terão os juízes do Tribunal Constitucional para apreciar qualquer pedido de fiscalização que surja) é se estes repetirão a iníqua sentença de há dois anos declarando-se pela inconstitucionalidade mas sem a correspondente aplicação dos efeitos práticos – em nome da transitoriedade da extraordinária crise – ou se, ao invés, levam o seu juízo até às últimas consequências e lá voltaremos a ouvir o coro de lamentações dos costumeiros apaniguados e uma oportuna justificação para o prolongamento da política de “austeridade expansionista” e para a continuação do empobrecimento geral.

Não se estranhe pois que depois das vozes que internamente se têm erguido contra esta política e esta forma capciosa de fazer política que subverte os mecanismos de contra-poder, até já do estrangeiro chegue o aviso de que estará «Portugal sob «alto risco» de agitação social em 2014» e a sua origem não parte de nenhum velho republicano mais empedernido ou dum qualquer grupelho da extrema-esquerda radical – expressão que no novo dialecto governativo até já inclui parceiros do arco do poder (leia-se a notícia do PUBLICO onde o «PSD acusa PS de alinhar com a "extrema-esquerda radical"») – antes da conceituada e muita ponderada revista THE ECONOMIST (o artigo pode ser lido aqui), facto que será seguramente tido na devida conta, contribuindo para agravar a despesa pública com a indispensabilidade de reforço das equipas de segurança pessoal dos membros do Governo.


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